“Bakhtin não se ateve à crítica da definição formalista da literatura (para substituí-la por outra); não, ele simplesmente renunciou a procurar a especificidade literária. Não que essa tarefa perca todo sentido a seus olhos; mas esse sentido só existe em relação a uma história particular (da literatura ou da crítica) e não merece a posição central que lhe atribuíram. O que lhe parece agora muito mais importante são todos os laços que se tecem entre a literatura e a cultura, enquanto “unidade diferenciada” dos discursos de uma época. Daí seu interesse pelos “gêneros primários”, isto é, as formas de conversação, de discurso público, de trocas mais ou menos regulamentadas. Mais do que “construção” ou “arquitetônica” a obra é acima de tudo heterologia, pluralidade de vozes, reminiscência e antecipação dos discursos passados e futuros; cruzamento e ponto de encontros; ela perde de repente sua posição privilegiada. ”
conspiração
“But the Link kiosks will pay for themselves by displaying onscreen ads that will be “hypertargeted” to people within range, based on data their smartphones silently provide. This explains why the smart city is being hailed as a breakthrough in marketing circles. And yet, contemplating the kiosk (or monolith, depending on your point of view) just installed outside my lower-Manhattan apartment house, I can’t help thinking about the “Credit Poles” in Gary Shteyngart’s novel “Super Sad True Love Story.” In Shteyngart’s unnervingly prescient satire, these ubiquitous, faux-rustic street fixtures display the credit ranking of every passerby in L.E.D. numerals—flashing red L.E.D. numerals, if the ranking isn’t high enough. Ratti and Claudel, citing the urbanist and author Adam Greenfield, write of “everyware,” an invisible network of sensors and cameras that finally achieves the ultimate dream of urban efficiency and security at the cost of anything resembling privacy. ”
Fui sempre simpático às teorias conspiratórias. Parece meio improvável pensar a opção pelo sedentarismo, pela progressiva concentração de pessoas em espaços curtos, sem imaginar o desenvolvimento de hierarquias e certa obsessão de um pela vida do outro.
Por isso, gostei dessa nota publicada na New Yorker, tratando dos cruzamentos entre os espaços físicos e virtuais, na construção e organização das cidades, num futuro que começa agora. Se a digitalização da informação garante, cada vez mais, acesso imediato a dados sobre o funcionamento do circuito urbano (trânsito, acidentes, incidentes, serviços), viabiliza, por outro lado, o monitoramento constante de quem acha - e só acha - que está observando a cidade acontecer. Como já virou clichê dizer, estamos sendo o tempo todo observados.
O que a matéria destaca de interessante, para além do primeiro clichê, é a ideia de que, mais do que acompanhar nossos deslocamentos geográficos, performáticos, estéticos e sensíveis, dispositivos como smartphones estão fornecendo, permanentemente, dados sobre percursos mais íntimos: nossa rede de contatos, a localização geográfica da nossa rede de contatos, nossos likes, nossas buscas, nosso histórico de cyber flânerie, nossos gastos etc.
A possibilidade de exibição de anúncios, mediante dados colhidos dos nossos celulares, institui - de fato - uma dimensão ciborgue em cada um de nós. O aparelhinho passa a dizer e respirar como parte dos nossos corpos, moldando nosso espaço social, ao mesmo tempo que é afetado por ele, mais e mais um espaço sócio-tecno lógico e crático.
uprooting me
naquele dia
éramos dois horizontes na poltrona da sala
nave repousada na calmaria de dois olhos úmidos
quem sabe?
quando a gente pensa alguma coisa
e não diz
quando a gente deixa de dizer
Om
procura aquela música
traz um pouco de suco
olha que gracinha
queria o dia pra sempre
horizonte
oh rizo- longe
vai chegar?
e de lá
adivinha?
não há
de ter
volta
Blu, helped by a group of activists, covered over his own works with grey paint
“A week later, on March 18, an exhibition called “Street Art: Banksy & Co” was scheduled to open. The exhibition was organized by the Fondazione Carisbo, a local bank-owned foundation whose president is Fabio Roversi Monaco, the former rector of the University of Bologna, as well as the former president of BolognaFiere, a public-private partnership that organizes exhibitions. In Bologna, the name Roversi Monaco evokes power, money, and banks. The exhibition was expected to display works of art removed from walls with the stated intention of “salvaging them from demolition and preserving them from the injuries of time,” which means turning them into museum pieces, and eventually transforming them into value.”
part of the very mass culture
“The art system is thus on its way to becoming part of the very mass culture that it has for so long sought to observe and analyze from a distance. Art is becoming a part of mass culture, not as a source of individual works to be traded on the art market, but as an exhibition practice, combined with architecture, design, and fashion—just as it was envisaged by the pioneering minds of the avant-garde, by the artists of the Bauhaus, the Vkhutemas, and others as early as the 1920s. Thus, contemporary art can be understood primarily as an exhibition practice. This means, among other things, that it is becoming increasingly difficult today to differentiate between two main figures of the contemporary art world: the artist and the curator.”
mito
“Por não revelarem nada, Ralf Hütter e Florian Schneider criaram uma aura mítica em torno da banda. O princípio de criação de um mito é nunca explicar nada. ”
art and illustration
“In 1901, for example, Bok offered reprints of Ladies Home Journal illustrations (without text) for sale to the public. The notice stated that the reproductions (by W. I. Taylor), if framed, were ‘works of art fit to hang beside any painting’. [...]
Artists and editors were conscious of vocational differences between illustrators and career painters. Nevertheless, the practices of Curtis, Bok, and Lorimer contributed to a blurring of borders between art and illustration on the part of the general public, who framed the pictures of and for whom such covers signified ‘art’. ”
John Sloan, "The Football Puzzle" (outubro de 1901)
parade: satie + picasso + cocteau
Baroness Elsa von Freytag-Loringhoven
Well before Duchamp
“New York was a good place for her. With the city as her stage, she became one of the 20th century’s first performance artists and a proto-Dada star. She demolished boundaries, between genders, between art and fashion, art and politics, public and private. She preached sensation, surprise. On the street, she wore a birdcage over her head and a tin-can bra. Indoors, she preferred loosefitting wraps that could be whipped off, leaving her nude. Taking lovers of various erotic persuasions, she was a pioneer of queer. She wrote language-crunching, censorship-challenging verse in a steady stream and, well before Marcel Duchamp, invented the readymade as art.”
a morte do pai
Vou aproveitar o intervalo para comentar uma leitura que adiei e que, talvez por ter sido tão adiada, tenha concentrado carga - e descarga, se posso dizer assim - poética.
Falo do primeiro número da saga Minha luta, de Knausgård. Decidi ler, assim, meio de repente. Não tanto pela FLIP, mas provavelmente pela overdose expositiva que, por conta do evento, os livros ganharam nas mesas e vitrines das boas livrarias de São Paulo. Então, lá estava eu com A morte do pai em mãos, caminhando para o caixa, por cima da forte resistência que passei a adotar diante dos hits editoriais, especialmente após Liberdade, do Franzen, demasiado Desperate housewives para a minha paciência de leitor.
Logo que comecei o livro, fiquei um pouco receoso em relação às cotas generosas de descrição, que, num primeiro momento, me fizeram pensar justamente na experiência odiosa que tive com o autor de As correções. Mas, conforme avançava as páginas, fui me dando conta de que estava diante de um texto bem diferente, muito mais confessional e menos irônico. Infinitamente mais cru e bonito.
A morte do pai é um oceano de delicadezas, dos avanços e retrocessos que fazem da vida a vida, de inseguranças e atrevimentos, de paisagens acinzentadas e humores de tantas cores diferentes. É cheio de digressões que às vezes nos perdem, justamente porque nos levam para digressões das nossas próprias histórias, que redescobrimos não tão perdidas como a rotina monocromática nos quer fazer crer. E, pelo menos no meu caso, que acredito incluir muitos outros casos da minha geração, e de gerações posteriores também, as longas páginas de realismo descritivo, muitas vezes causa de distanciamento, são - na contramão - a causa de uma incrível identificação com o narrador.
Chorei quando os irmãos colocam um CD do Supergrass, a caminho do enterro do pai. Chorei quando Karl Ove escolhe vestir uma camiseta do Boo Radleys. Chorei quando Karl Ove fala da vontade de criar uma publicação que combinasse dadaístas e cultura pop, literatura de butique e quadrinhos. Chorei durante toda a demorada limpeza que fazem na casa, quando o contato com o mais mínimo objeto está iminentemente em condições de abrir toda uma via de acesso a lembranças capazes de organizar ou bagunçar a ideia e a explicação que fazemos de nós mesmos.
Chorei quase o tempo todo. E, enquanto não chorava, nos momentos em que a leitura ficava tediosa, insistia no desbravamento de cada linha porque sabia que não tardaria a hora de voltar a chorar.
O livro é bonito demais.
Já comecei Um outro amor, o segundo, e, ao que tudo indica, caminharei com Karl Ove até onde ele quiser me levar. Tá buenísimo.
ser outro
“Toda vez que o leitor revive de verdade o poema, atinge um estado que podemos chamar poético. Tal experiência pode adquirir esta ou aquela forma, mas é sempre um ir além, um romper os muros temporais para ser outro. ”
imagem e criaçao
“Ser ambivalente, a palavra poética é plenamente o que é - ritmo, cor, significado - e, também, é outra coisa: imagem. A poesia transforma a pedra, a cor, a palavra e o som em imagens. E essa segunda característica, ser imagens, e o estranho poder que elas têm de suscitar no ouvinte ou no espectador constelações de imagens, fazem de todas as obras de arte poemas. ”